O contributo do Direito dos Resíduos para o PERSU 2030
O setor dos resíduos urbanos registou nos últimos anos um progresso notável.
E a esse facto não é alheia a capacitação técnica e científica, com uma especialização em várias áreas do saber, nomeadamente na engenharia, na economia, na gestão e, no que aqui pretendemos tratar, no direito.
Assim sendo, cumpre evidenciar que hoje podemos falar de um direito dos resíduos. Senão vejamos.
O direito dos resíduos pode ser definido como um conjunto de normas e princípios jurídicos que disciplinam a gestão dos resíduos, entendidos como “quaisquer substâncias ou objetos de que o detentor se desfaz ou tem a intenção ou a obrigação de se desfazer” – vide, alínea aa) do artigo 3.º do Regime Geral da Gestão dos Resíduos (doravante designado como RGGR) aprovado pelo Decreto-Lei nº 102-D/2020, de 10/12.
Esta noção de resíduos atende à intenção do detentor. A intenção de “desfazer-se” tem provocado alguma controvérsia doutrinal, mas não é esse, neste breve trecho, o nosso tema.
Assim, segundo as mais recentes correntes doutrinárias existem determinadas razões justificativas para a autonomia do direito dos resíduos. Falar em direito dos resíduos é falar num ramo do direito do ambiente.
Não nos interessa, nesta sede, desenvolver um aprofundado estudo sobre o enquadramento sistemático deste ramo do direito. Porém, julgamos valer a pena ater-nos um pouco sobre aos seus princípios orientadores, distinguindo-se dois grandes grupos: princípios próprios do direito do ambiente e princípios próprios do direito dos resíduos.
Quanto aos primeiros, destacamos: i) princípio da precaução – prevê a possibilidade da existência de medidas cautelares, assentes na teoria do risco. Na senda daquilo que tem vindo a ser dito pela jurisprudência “quem cria uma situação de perigo tem o dever de a remover, independentemente da violação de um direito absoluto, se ela envolver uma grande propensão para a ocorrência de danos”.
Quanto aos princípios próprios do direito dos resíduos estes são indicados pelos artigos 4.º e seguintes do RGGR. Destacamos, dessa forma:
i) princípio da autossuficiência e da proximidade – que prevê a existência de equipamentos capazes à correta gestão de resíduos, em respeito pelos princípios de proteção do ambiente e da saúde pública;
ii) princípio da responsabilidade pela gestão – intimamente ligado ao princípio do poluidor pagador, defende que a responsabilidade pela gestão dos resíduos, incluindo os respetivos custos, cabe ao produtor inicial dos resíduos sem prejuízo de poder ser imputada, na totalidade ou em parte, ao produtor do produto que deu origem aos resíduos e partilhada pelos distribuidores desse produto se tal decorrer de legislação específica aplicável (artigo 9.º do RGGR).
São precisamente estes dois princípios, que pretendemos reforçar e salientar, que devem ser tidos em conta na definição do PERSU2030. Uma política que não acautele estes princípios está condenada ao fracasso. Esperamos e desejamos que tal não aconteça.
Paulo Praça é licenciado em Direito com pós-graduações em Direito Industrial, Direito da Interioridade e Direito das Autarquias Locais. Título de Especialista em Solicitadoria. É Diretor-Geral da Resíduos do Nordeste e Presidente da Direção da ESGRA – Associação de Empresas Gestoras de Sistemas de Resíduos.
Docente convidado na Escola Superior de Comunicação, Administração e Turismo do Instituto Politécnico de Bragança, no Mestrado de Administração Autárquica e na Licenciatura de Solicitadora, nas matérias de Ordenamento, Urbanismo e Ambiente.
Foi Adjunto da Secretária de Estado Adjunta do Ministro da Economia, no XV Governo Constitucional, Assessor do(s) Ministro(s) da Economia e do Ministro das Finanças e da Economia, no XIV Governo Constitucional, e Assessor do Ministro da Economia, no XIII Governo Constitucional.
Nos últimos anos tem participado em diversas ações de formação como orador e como participante. É também autor de trabalhos publicados.