Saneamento, a vida bem tratada, é o resultado esperado sempre.
Inusitadas interpretações do resultado dos leilões recentes para concessão de serviços de saneamento básico, parecem querer forçar o entendimento de que o sucesso nas surpreendentes outorgas em Alagoas, por exemplo, merece ser classificado como a certificação dos resultados do modelo de gestão.
Entre um fato e outro, o passado e o presente, este, sempre amparado pela realidade, pedem que se vá com calma porque, parafraseando ditados, muita coisa ainda há para acontecer no Brasil. Em Alagoas, a tarifa média da CASAL, em 2020, já era mais de um euro por metro cúbico e em 2021, já havia sofrido um primeiro reajuste após a concessão da região metropolitana passar a ser operada plenamente pela BRK.
Este "ativo", certamente acirrou os interesses no Bloco "A" em 2020, porém em 2021, para os Blocos "B" e "C", a realidade assustou o presente, embora ainda fosse a tarifa muito mais relevante que o modelo e outorga surpreendente fosse aplicada no Bloco "B". Deve-se dizer que não se desqualifica ou diminui a importância da modelagem, entretanto, por si só, como no final da década de 90, talvez ela não despertasse tanta coragem no pagamento de outorgas, sem tarifa tão atraente.
Refletindo sobre a realidade e o presente, merece que se avalie exatamente os leilões bem sucedidos ocorridos após o do Bloco "A" em Alagoas, para que se busque sensatez e prudência na comemoração. Atualmente, o mercado tem se movimentado de várias forma e de maneira diferente em cada Estado, inclusive Alagoas. Ou seja, parece não haver espaço para "ideias fixas".
Esta introdução tem como fito, reforçar a necessidade de se gerenciar com muita atenção os efeitos do novo marco regulatório, para que esperanças e realidades iniciadas não se percam nos caminhos mal explicados do que ocorreu no monopólio e regionalização, praticado pelas Companhias Estaduais, à luz do PLANASA-Plano Nacional de Saneamento.
A critica ao passado com base na ineficiência crônica de algumas Companhias, mereceria uma certa atenção ao fato de que o modelo do PLANASA, inclusive de regionalização com a exclusão de municípios que não aderiram ao modelo como hoje, poderia se classificado como bem sucedido até meados dos anos 80. Extinto o BNH-Banco Nacional de Habitação - "regulador do saneamento à época" - os ajustes que poderiam ser feitos no modelo, perderam-se na deriva em que seguiram as Companhias Estaduais, algumas encontrando um rumo e outras não.
O passado também trouxe aprendizados que hoje são úteis, como a lenta participação do setor privado desde 1995 e a melhoria dos contratos de concessão desde 2007 - lei nº 11.445 - com metas, indicadores e regras, além dos contratos de programa, com seus vícios políticos, porém, um avanço em certos lugares.
Com o advento da lei nº 14.026/2020, do novo marco, abriu-se a oportunidade legal, apesar dos questionamentos, para se buscar mudar o que já se constatara há tempos: a maioria da Companhias Estaduais não tinha mais condições de suportar o modelo praticado. Suas capacidades de atender dignamente aos municípios onde operavam, com contratos regulares ou não, estava esgotada. Reduzir seus tamanhos e abrir espaço para novas modelagens com o setor privado, é sem dúvidas um dos méritos do novo marco.
Como escrevem outros estudiosos, o novo marco não veio só para aumentar a participação do setor privado. Veio reforçar a participação do poder público na fiscalização e regulação dos contratos de concessão com empresas privadas ou públicas ou nos modelos em que o município siga autônomo. Esta necessária atuação do poder público, é um dos grandes riscos para o sucesso dos modelos.
Assim, poderia se considerar que os aprendizados do novo marco já podiam apontar para urgentes revisões em:
- Editais e termos de referência para contratação de modelagens com mais rigor na seleção de empresas e qualificação, menos pelo preço e mais pela capacidade técnica;
- Editais e termos de referência para contratação de operadores mais rigorosos na qualificação institucional, gerencial e de compliance das empresas;
- Revisão da utilização da maior outorga e da forma de pagamento desta, a curto prazo, como regra mais usual;
- Fortalecimento da relação da ANA em seu novo papel, com as agências locais;
- Definição de formas mais objetivas de avaliação do trabalho das agências reguladoras infranacionais na regulação dos contratos firmados à luz do novo marco regulatório.
- Criação no Governo Federal, de instância que possa monitorar periodicamente o papel fiscalizador dos Estados no contratos de concessão, quando este for o contratante.
Os bem sucedidos leilões e suas outorgas maravilhosas, resultaram em importantes contratos para lugares como Rio de Janeiro e Amapá, além de Alagoas. A hora é de muita atuação e diligência do poder público, principalmente o Estadual, na gestão destes contratos de concessão e seus comitês.
Álvaro José Menezes da Costa, Engenheiro Civil, MSc em Recursos Hídricos e Saneamento, consultor.